Avaliação in vitro da eficácia do cloreto de benzalcônio na inativação de cistos de Giardia spp. de cães
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Introdução
O gênero Giardia foi descrito por Kunstler em 1882. Este gênero é constituído por protozoários cosmopolitas que ocorrem principalmente em regiões tropicais (OLSON, 2001). O ciclo de vida consiste em dois estágios: trofozoítos e cistos viáveis. O cisto viável ingerido é a forma infectante, sendo capaz de sobreviver em ambiente externo adequado por longos períodos. Os cistos podem ser ingeridos através da água e de alimentos contaminados, mas a transmissão direta pela via fecal-oral também é possível, especialmente em áreas em que os animais se encontram aglomerados, como em canis e gatis. As amostras fecais de cães e gatos podem contribuir também para a contaminação da água. As formas de cistos são invariavelmente os mais resistentes à desinfetantes químicos (DIAZ et al., 1996, apud BECK et al., 2005).
Em literatura, há grande escassez de dados referentes à eficácia, efeitos ou até mesmo sobre o modo de ação de desinfetantes sobre protozoários e suas formas resistentes. Os agentes catiônicos (que englobam os compostos de amônia quaternária) são os desinfetantes e antissépticos mais utilizados (FRIER, 1971 citado por McDONNELL, 1999). Os desinfetantes do grupo das amônias quaternárias, como o cloreto de benzalcônio, são eficazes no combate à infecção ambiental proveniente de animais infectados através da eliminação de cistos pelas fezes. Geurden & Claerebout (2006) desenvolveram um estudo comprovando a eficácia do uso de uma solução de amônia a 10% como medida de controle de infestação ambiental por vacas infectadas e tratadas com fenbendazole e obtiveram resultados positivos.
O presente estudo teve como objetivo avaliar a eficácia de um composto do grupo das amônias quaternárias, o cloreto de benzalcônio (Herbalvet T.A.®) em cistos de Giardia spp.
Material e Métodos
Foram selecionados 6 cães jovens, com idade de 09 a 11 meses, machos e fêmeas, oriundos do canil do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com peso médio de 11,8 ± 1,2 kg, sem raça definida, como doadores de cistos de Giárdia. Os animais foram mantidos em baias individuais de alvenaria, alimentados com ração comercial e água ad libitum, sem alterações no manejo alimentar a que eram submetidos rotineiramente. Estes cães passaram por coletas de fezes diárias para obtenção de cistos. O método utilizado para identificação dos cistos de Giárdia nas fezes dos cães foi o de Faust et al.(1939), segundo Hoffmann (1987).
Após as coletas e identificação das amostras as mesmas foram encaminhadas ao laboratório de análises clínicas do Hospital Veterinário da UFU, onde foram processadas através do Método de Sedimentação Espontânea (MÉTODO DE HOFFMAN, PONS & JANER). Destaca-se que não há disponível uma metodologia de referência específica para a avaliação da eficácia de desinfetantes sobre cistos de giárdia (Reader´s Forum, vol.25, n.4, pag.339). Sendo assim, o método quantitativo para a avaliação da eficácia mostrou-se o mais apropriado, uma vez que, pelo modo de ação do cloreto de benzalcônio, espera-se uma desnaturação dos cistos de Giárdia com consequente perda da morfologia. Dessa forma, a contagem de cistos íntegros antes e depois da ação do desinfetante demonstra a atividade do mesmo.
Após 10 dias de colheita e processamento das amostras de fezes dos cães os tubos de ensaio contendo cistos em solução salina 0,9% foram centrifugados, o sobrenadante descartado e as amostras de todos os tubos concentradas em um único tubo com o objetivo se obter uma solução de cistos com uma concentração mínima de 6 cistos para cada 100 microlitros de solução salina a 0,9%. Constatada que a concentração de cistos estava adequada, e que os mesmos estavam em perfeitas condições, a solução de cistos foi armazenada novamente em estufa BOD com 80% de umidade a 25°C. Posteriormente foram preparadas as concentrações do produto para serem testadas sobre os cistos de Giardia spp.
Foram utilizadas placas de cultura celular contendo 96 poços da marca Microplat Flat, Lote: 080081, Fabricação 03/08, Exp: 03/13. Em cada poço foram adicionados 200 microlitros da solução do pool de cistos de Giardia spp. (Figura 1) que apresentava uma contagem média de 17,16 cistos de giárdia em 200 microlitros de solução. Também foi adicionado aos poços 400 microlitros da solução desinfetante, sendo 6 repetições para cada concentração do desinfetante testado. Foi adotado um controle negativo para o teste.

Figura 1. Placa com solução de cistos de Giardia spp. e adição de solução desinfetante na linha A (1:500) e B (1:700) e o controle negativo na linha C.
Foram testadas 02 diferentes diluições do produto a base de cloreto de benzalcônio*.
Cada linha foi identificada com a concentração do produto que estava sendo avaliada:
Linha A: 200 μl de solução contendo Giardia spp. e 400 μl do produto em teste na diluição de 1 L para 500 L de água.
Linha B: 200 μl de solução contendo Giardia spp. e 400 μl do produto em teste na diluição de 1 L para 700 L de água.
Linha C: 200 μl de solução contendo Giardia spp. e 400 μl Solução Salina.
A placa contendo as diferentes concentrações do desinfetante testado foi incubada em estufa bacteriológica a uma temperatura de 27°C e, por 10 a 60 minutos após a adição da solução desinfetante, procedendo-se a leitura de cada uma das repetições nos momentos 10 minutos, 20 minutos, 30 minutos e 1 hora após a adição da solução desinfetante, desde que os cistos permanecessem íntegros para efetuar a leitura no momento posterior. Nestas leituras foram contados os números de cistos em cada poço e também foi avaliada a integridade da parede do cisto, quanto ao rompimento em comparação aos cistos das amostras do controle negativo.
Para a avaliação da viabilidade coletou-se uma pequena alíquota de cada repetição para cada diluição testada, montou-se uma lâmina com esta amostra e a mesma foi corada com lugol e levada ao microscópio óptico no aumento de 10, 40 e 5 vezes para avaliação da existência dos cistos.
A eficácia do produto foi avaliada comparando-se as contagens de cistos viáveis dos poços do(s) grupo(s) tratado(s) com as do grupo controle. A porcentagem da eficácia foi calculada usando-se a seguinte fórmula:
Cálculo da Eficácia
% Eficácia= (Média aritmética de cistos viáveis do grupo controle – Média aritmética de cistos inviáveis tratado/ Média aritmética de cistos viáveis do grupo controle) X 100.
Para análise estatística os dados foram submetidos ao Software INSTAT 1998, ao teste de Tukey ao nível de 95% de confiabilidade.
Foram considerados cistos viáveis aqueles que permaneceram com a parede íntegra quando observados ao microscópio óptico no aumento de 40 vezes.
Resultados e Discussão
Na tabela 1 é apresentado o número total resultante das contagens de cistos de Giardia spp. em cada poço de cultura e a média aritmética do grupo controle (C) e dos tratados (A e B).
Tabela 1. Contagens de cistos do grupo controle e dos tratados. Número total, média aritmética e eficácia.

Após a aplicação da solução desinfetante a base de cloreto de benzalcônio*, aplicada na diluição de 1L/500 L para a repetição A e de 1L/700 L para repetição B, verificou-se que as diluições usadas em A e B apresentaram 100,00 % de eficácia 10 minutos após a adição do produto, uma vez que não se observou mais a presença de cistos 10 minutos após a adição da solução desinfetante. Nesse mesmo tempo, as repetições da linha C (controle) apresentaram contagem média de 10,67 cistos.
Comparando-se o valor médio da contagem de cistos de Giardia spp. das amostras que receberam solução desinfetante em relação à amostra controle (Tabela 2), constatou-se que houve diferença estatística significativa nos valores médios da contagem de cistos (p≤0,05).
Tabela 2. Valor médio e desvio padrão das contagens cistos de Giardia spp. dos grupos: Cloreto de benzalcônio* (A e B) e Controle (C) antes (D0) e após (10 minutos) da adição da solução desinfetante.

Letras maiúsculas (A, B, C) iguais na mesma coluna não diferem entre si e letras minúsculas (a, b) iguais na mesma linha não diferem entre si através do teste de Tukey (p≤0,05).
Abaixo o Gráfico 1 ilustra as médias aritméticas obtidas a partir das contagens de cistos dos grupos: controle e tratados.
Gráfico 1. Relação das médias aritméticas dos cistos de Giardia spp. dos grupos controle e tratados, antes do tratamento no D0 e 10 minutos após o tratamento.

Não foi realizada a leitura nos tempos posteriores (20, 30 e 60 minutos de incubação), uma vez que no primeiro momento de leitura as amostras de cisto já se mostraram inativadas.
Conclusão
O produto a base de cloreto de benzalcônio*, na diluição de 1L para 500 L de água e 1L para 700 L de água mostrou-se eficaz na inativação de cistos de Giardia spp.
Espera-se atingir um percentual de eficácia de 100% na inativação de cistos de Giardia spp. após a exposição por 10 minutos a uma solução desinfetante de cloreto de benzalcônio*, na diluição 1L para 500 L.
Referências Bibliográficas
OLSON, M.E. et al. The use of a Giardia vaccine as an immunotherapeutic agent in dogs. Can Vet J, Volume 42, November 2001.
BECK, C. et al. Frequência da infecção por Giardia lamblia (Kunstler, 1882) em cães (Canis familiaris) avaliada pelo Método de Faust e cols. (1939) e pela Coloração da Auramina, no município de Canoas, RS, Brasil. Ciência Rural, Santa Maria, v. 35, n.1, p. 126-130, jan-fev, 2005.
FRIER, M. Derivatives of 4-amino-quinaldinium and 8-hydroxyquinoline, p. 107-120. In:W.B. Hugo (ed.), Inhibition and destruction of the microbial cell. Academic Press, Ltd., London, England.
McDONNELL, G.; RUSSELL,D. Antiseptics and disinfectants: activity, action and resistant. Clinical Microbiology Reviews, Jan. p. 147-179, 1999.
GEURDEN, T.; CLAEREBOUT, J.V.E. Field testing of a fenbendazole treatmente combined with hygienic and management measures against a natural Giardia infection in calves. Veterinary Parasitology (2006). Disponível em: http://www.sinervia.com/library_files/2014732330_Panacur%20on%20Giardia.p df. Acesso em 09/02/2012.
HOFFMANN, R.P. Diagnóstico de Parasitismo veterinário. Porto Alegre: Sulina, 1987. 156p.